O Presidente francês François Hollande, a chanceler alemã Angela Merkel e o primeiro-ministro italiano Mario Monti

Uma união bancária feita por medida para a Alemanha

Passada a euforia sobre o acordo por fim alcançado pelos 27 sobre a supervisão bancária, embrião de uma união bancária, a imprensa europeia mostra-se menos entusiasmada perante os pormenores do mecanismo elaborado em Bruxelas.

Publicado em 14 Dezembro 2012 às 15:11
O Presidente francês François Hollande, a chanceler alemã Angela Merkel e o primeiro-ministro italiano Mario Monti

É, sobretudo, o sentimento de ter cedido ao diktat da Alemanha, que impôs que o supervisor único europeu não possa interessar-se pelos bancos locais, que suscita críticas.

“O acordo parece ser de envergadura mas, na verdade, é insuficiente”, argumenta o NRC Handelsblad. “É dececionante, quatro anos depois do início da crise dos subprimes“. O diário holandês lamenta, sobretudo, que

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a grande maioria dos seis mil bancos [europeus] continuem a ser da responsabilidade do regulador nacional e dependam, assim, da confiança mútua entre bancos, que se revelou, no passado, mais desigual do que se pensava […] A crise dos subprimes mostrou até que ponto os bancos estão ligados uns aos outros. Só nos damos conta disso quando degenera […] veja-se o que se passou na Islândia e sobretudo no caso Fortis, onde os interesses nacionais passaram à frente do interesse comum. Só uma supervisão centralizada por todos os bancos pode lutar contra isso. Além disso, ainda não foram tomadas decisões sobre as duas etapas cruciais seguintes: o encerramento dos bancos falidos e uma rede financeira comum que separaria, finalmente, o destino dos Estados do destino dos bancos.

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Do lado alemão, o Frankfurter Allgemeine Zeitung fornece uma panóplia de argumentos segundo os quais a nova supervisão bancária é uma má notícia, justamente no momento em que os bancos da zona euro estão três vezes mais endividados do que os Estados-membros. Para o FAZ, o problema está no todo-poderoso Banco Central Europeu (BCE), uma instituição não-eleita, como lembra o diário. Com a sua dupla função de banco central e autoridade de supervisão, deixará de estar em posição de cumprir a sua função de garante da estabilidade dos preços.

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Apesar de uma supervisão comum dos bancos europeus fazer sentido, está muito mal colocada sob a égide do BCE. Até agora, o banco central tinha por única obrigação garantir a estabilidade dos preços. Doravante, viverá com um conflito de objetivos por causa da supervisão. Como irá decidir quando a inflação precisar de um aumento das taxas de juros mas forem essas taxas, exatamente, a afundar os bancos? Além do mais, é duvidoso que o BCE vá pôr em causa instituições financeiras cuja sobrevivência sob a forma de banco zombie tem garantido durante anos à custa de injeções de dinheiro.

Foi escolhido um "modelo erróneo" para a união bancária, escreve o diário El País. Uma decisão “imposta” pela Alemanha e que “fratura” o mercado financeiro europeu em dois grandes blocos: as grandes instituições, sob a supervisão do BCE, e as que têm ativos inferiores a 30 mil milhões de euros, sob supervisão dos governos nacionais. O diário madrileno mostra-se crítico:

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O acordo responde ponto por ponto às exigências alemãs. Angela Merkel já tratou de explicar ao Bundestag que o acordo é um triunfo alemão; agora, chegou o momento de explicar por que é que um triunfo para a Alemanha pode tornar-se um erro financeiro para a Europa. O objetivo da triunfante proposta [do ministro das Finanças alemão Wolfgäng] Schäuble é esconder a situação pouco encorajante das caixas alemãs e dos bancos dos Lander. O pretexto que esconde este fim é o de colocar sob a supervisão do BCE todo o risco sistémico europeu. Mas a realidade, demonstrada pelo caso de Espanha, é que as pequenas instituições também são capazes de intoxicar o sistema bancário nacional. E esta circunstância invalida o argumento alemão segundo o qual a supervisão dos seus bancos regionais não tem interesse, porque a Alemanha pagaria uma eventual consolidação dessas instituições. O risco não diz respeito à falência, mas sim à contaminação de ativos.

Argumento que também é usado pelo seu compatriota ABC : "o que a Alemanha esconde", escreve o diário, é o maus estado das caixas regionais. Isso

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explica boa parte das movimentações políticas de Angela Merkel, que foi capaz de defender o seu sistema financeiro e esconder as suas fraquezas como nenhum outro líder europeu. Bruxelas nunca gostou das caixas de aforro, mas a nova dama de ferro conseguiu fazer da Alemanha o seu último bastião, apesar da sua responsabilidade nos problemas [financeiros]. Os Landesbanken envolveram-se em operações internacionais muito arriscadas que deixaram uma fatura elevada. [Mas] os problemas da Alemanha ficarão na Alemanha, [que] já disse claramente que não gosta que outros se metam nas suas finanças. Apesar da união bancária, por agora, só o Bundesbank o poderá fazer.

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