Imposto europeu: um voto piedoso

A proposta da Comissão de criar um imposto europeu para financiar o orçamento da União Europeia tem tudo para agradar, sobretudo aos países contribuintes líquidos. Mas, diz De Volkskrant, depara com a hostilidade dos Estados-membros perante a transferência de competências numa matéria tão delicada.

Publicado em 11 Agosto 2010 às 14:42

Estaremos, nós, europeus, preparados para pagar um imposto direto a Bruxelas, dez anos depois da introdução da moeda única? O comissário europeu do Orçamento, Janusz Lewandowski, considera que chegou a altura de dar este novo passo na via para um Estado federal europeu. Lewandowski lançou a ideia no Financial Times Deutschland mas a sua proposta não tem qualquer hipótese de sucesso.

No entanto, o isco utilizado por Lewandowski para levar os Estados-membros da UE a passarem para o seu lado é tentador: em troca de uma taxa sobre as transações financeiras ou sobre os voos comerciais, a contribuição dos países da UE para Bruxelas seria reduzida. É uma ideia que não pode deixar de agradar a países como a Alemanha ou a Holanda. Há anos que o facto de serem pagadores líquidos é motivo permanente de tensão. Ao qual se junta o rigor orçamental a que são obrigados pelo pacto de estabilidade. Uma contribuição menos pesada para a UE convir-lhes-ia em absoluto.

Estratégia de sobrevivência

Contudo, as desvantagens são claramente superiores. Para os Estados-membros, um imposto direto cobrado por Bruxelas far-se-ia em detrimento das suas próprias competências neste domínio: a pressão fiscal sobre os cidadãos tem simplesmente limites, ainda que imprecisos. Por outro lado, a criação de um imposto é uma prerrogativa dos Governos nacionais, que são muito ciosos dela. "Se lhe dermos um dedo, Bruxelas vai querer o braço", é uma frase que já foi sem dúvida dita no Reino Unido, onde o medo do super-Estado europeu é inculcado logo na infância. Aliás, outros países europeus aproximaram-se dos britânicos neste sentido. Na Holanda e em França, a rejeição da Constituição europeia, em 2005, alterou a maneira de pensar a Europa. As propostas do comissário Lewandowski passam completamente ao lado deste euroceticismo acrescido.

Mas as propostas não são tanto fruto da bolha burocrática em que se encontra Bruxelas, como têm tendência a acreditar os eurocéticos, mas antes de uma estratégia de sobrevivência: de facto, a Comissão está a atuar na previsão de que as negociações orçamentais para o período 2014-2021 deverão ser ainda mais difíceis do que habitualmente, devido aos problemas financeiros dos Estados-membros. É por isso que uma fonte de receitas alternativa poderia ser uma solução. Só que esta deparará com a resistência acrescida no seio dos Estados-membros contra "mais Europa".

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Um orçamento da UE mais transparente

A ideia de pagar mais um imposto não irá por certo agradar aos contribuintes, salienta o [Süddeutsche Zeitung](http://www.sueddeutsche.de/geld/eu-forciert-eigene-steuer-sinniger-als-der-ist-zustand-1.986161). Mas a verdade é que "o imposto europeu não representará um encargo adicional", acrescenta este diário, que recorda que, em 2010, cada alemão contribui, indiretamente, com um montante de 260 euros para o orçamento da União Europeia. Em contrapartida, o imposto poderia desencadear a há muito esperada reforma desta última, que, todos os anos, dá origem a "negociatas entre os Estados-membros". "Se pagassem diretamente para a Europa, os cidadãos talvez estivessem mais atentos a para onde vai o seu dinheiro. E interrogar-se-iam sobre os motivos por que, no século XXI, a maior parte do orçamento da UE ainda é atribuída ao setor que dominava a economia do século XVIII, a agricultura".

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