Que futuro para a juventude espanhola? Estudantes em Barcelona.

Vem para a Alemanha, Pepe!

De um lado, a Alemanha que procura mão-de-obra para alimentar a sua retoma económica. Do outro, a Espanha em crise, onde os jovens licenciados não têm futuro. Tal como nos anos 1960, poderá vir a haver um novo fluxo migratório entre os dois países.

Publicado em 24 Janeiro 2011 às 13:04
Mike Lopez/Flickr/CC  | Que futuro para a juventude espanhola? Estudantes em Barcelona.

Nos tempos do ator Alfredo Landa, durante a massiva emigração de espanhóis para a Alemanha nos anos 1960, aquele a quem se dizia Vente a Alemania, Pepe [Vem para a Alemanha, Pepe – título de um filme de 1971] era o camponês galego, estremenho ou andaluz. Hoje, a Alemanha precisa de "Pepes" sem boina, qualificados e com um diploma. Pelo menos é o que afirma um recente relatório alemão, que poderá servir de chamariz para os órgãos de comunicação social quando da cimeira Espanha-Alemanha que se realizará a 3 de fevereiro, em Madrid.

O fenómeno tem uma certa base real: a Alemanha tem um reconhecido défice de técnicos qualificados. Mas poderá a emigração servir de paliativo para o problema do desemprego em Espanha, como aconteceu nos anos 1960? A primeira coisa que salta à vista é que as duas situações não são comparáveis.

Em 1960, a Espanha assinou um acordo sobre contratos de trabalho com o vasto setor industrial alemão ocidental, que esteve na origem do "milagre alemão" e esses contratos eram geridos pelo Instituto Espanhol da Emigração. Até 1973, mais de meio milhão de espanhóis emigraram para a Alemanha e, destes, cerca de 80% regressaram ao seu país. O fenómeno foi uma importante fonte de divisas para a Espanha franquista e permitiu preencher o défice de mão de obra que então existia na Alemanha. O contexto atual é muito diferente.

Duas linhas de atuação para vários milhões de empregos

Hoje, a Alemanha não está a viver nenhum "milagre", apesar de, de momento, conseguir manter um crescimento significativo devido às exportações. Tem, sim, um défice significativo de quadros qualificados. Para tentar resolver o problema, a Agência Federal do Trabalho (BA) acaba de divulgar um plano em dez pontos. Esse plano centra-se na melhoria da educação e na promoção da integração das mulheres no mercado de trabalho. As duas linhas de atuação poderão resultar num aumento de vários milhões de postos de trabalho até ao ano de 2025.

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Estima-se que uma maior integração laboral feminina tornaria possível por si preencher três milhões de postos de trabalho a tempo inteiro. No entanto, o problema não ficará resolvido sem o recurso à imigração, refere Raimund Becker, membro do comité diretivo da BA, em declarações ao Frankfurter Allgemeine Zeitung. Segundo Becker, será preciso mandar vir 800 mil estrangeiros.

Esse número reflete dois imperativos políticos. Em Madrid, o imperativo de um Governo que atravessa momentos adversos, cuja soberania está refém das autoridades europeias e que precisa de enviar uma mensagem de esperança no que se refere à política de emprego. Em Berlim, o imperativo de uma administração criticada em Bruxelas pela sua política económica egoísta e arrogante, e à qual não ficaria mal enviar sinais de ajuda aos perdulários do sul, asfixiados e com poucas perspetivas devido ao diktat da austeridade alemã. São estes os imperativos que os dois Governos terão em mente na cimeira bilateral de Madrid. Segundo Der Spiegel, o assunto será um dos principais temas da agenda de 3 de fevereiro.

Uma oferta aberta a todos os países europeus em dificuldades

A oferta de emprego na Alemanha não se destina apenas a Espanha mas a todos os países europeus que atravessam maiores dificuldades, incluindo os cérebros desaproveitados do Leste da Europa. O Governo espanhol, que não discute o diktat e que se limitou a apresentar ligeiras objeções a Berlim, receberá este recurso de braços abertos. Mas quanto vale ele realmente?

A emigração para a Alemanha de jovens espanhóis com títulos universitários já é uma realidade: há milhares deles em Berlim, de um modo geral com empregos precários a tempo parcial. Por isso a afirmação do segundo porta-voz parlamentar da CDU alemã, Michael Fuchs, de que "no sul e no leste da Europa há muitos jovens desempregados", soa a redescoberta da pólvora.

O que é certo é que a Alemanha quer mudar a sua aposta em matéria de imigração: menos camponeses da Anatólia, os "pepes" turcos, e mais licenciados sem futuro, vindos de Espanha, da Grécia e da Europa de Leste. No total, são muitos os que terão de dividir a oferta e talvez se trate apenas de alguns milhares de empregos até 2025. Mais do que perante um Vente a Alemania, Pepe, talvez estejamos perante um remake de Bienvenido Mister Marshall [Bem-vindo, Mr. Marshall], de [Luis García] Berlanga [filme espanhol de 1953 sobre as vãs esperanças suscitadas pelo Plano Marshall, numa pequena aldeia de Espanha]. "Bem-vindo, Mr. Müller".

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